Hoje de manhã, uma colega pedagoga perguntou a minha opinião a respeito da aquisição da alfabetização universal, ou seja, se eu considero que todas as pessoas são capazes de serem alfabetizadas. Calei. Refleti sobre a questão. Concluí que nunca havia pensado nisto, que não tenho competência para emitir opinião sobre o assunto, não tenho conhecimento bastante para analisar a questão, nem sei por onde começar. Pensei mais um pouco e entendi que esta questão é da ordem da pedagogia.
O posicionamento
de retirada perante uma questão que não compete a nós respondermos é uma
atitude respeitosa com a outra área.
Há anos (e
de forma cada vez mais corriqueira) temos recebido laudos médicos de nossa/os
estudantes com instruções (vejam bem, não são orientações) de como agir com a
referida criança na escola. O curioso é que as instruções são iguais para cada
diagnóstico como se as crianças fossem a mesma, como se tendo o mesmo
diagnóstico, as elas apresentassem o mesmo comportamento.
Fundamenta
esta ação médica sua autoridade social. O/A médico/a informa à professora como
deve agir para melhor ensinar aquela criança. Porém o que sabe um/a médico/a
sobre o processo ensino-aprendizagem? Mesmo que um determinado médico tenha
formação em pedagogia ou tenha cursado o magistério, ele não conhece aquele “paciente”
com profundidade bastante para saber quais ações a professora deverá escolher
para potencializar ou garantir o aprendizado daquele/a estudante específico/a. Ele/a
não conhece a escola, a/os colegas de turma ou de turno, não sabe dos recursos
disponíveis para o ensino na instituição, muitas vezes não foi informado/a das
condições de vida da família a qual a/o estudante pertence nem os recursos de
sua vizinhança.
Eu julgo
esta ação desrespeitosa. O/A profissional de medicina não tem competência para
orientar a ação da professora em sala de aula. Aqui me refiro a competência
formal e legal.
Então, por
que as professoras seguem o que um/a médico/a lhes indica? Por que a professora
pergunta a profissionais de outras áreas o que deve fazer com seu/sua
estudante? A profissional de sala de aula não se sente desrespeitada?
Sim, minhas
professoras esperam que eu lhes diga como devem agir com seus/suas estudantes.
Eu lhes digo que não sei. E reforço dizendo que não tenho competência legal
para emitir tal opinião.
Quando me retiro da posição de
responder uma questão pedagógica, não abandono minha professora a própria
sorte. Ao contrário, coloco ela no local protagonista de resolução, de posse do
conhecimento, de poder.
Quando
dizemos a alguém “vá! Você é capaz de resolver esta questão com autonomia.” não
a/o estamos abandonando, mas depositando nossa confiança de que encontrará a
melhor solução ou construirá a resposta mais adequada. Esta ação possibilita o
fortalecimento personológico e profissional de quem se considera inapta/o. São
desafios propiciadores de desenvolvimento.
Realizar
por é prejudicial mesmo na fase adulta. Realizar com, cooperar
respeitando os limites de competência de cada área de atuação é engrandecedor.
Por acreditar
nesta ideia, sempre que um/a médica/o, um/a mãe ou pai, um/a psicóloga, uma
psicopedagoga emite uma sugestão de ação docente ou escolar, eu declaro em alto
e bom som “quem esta pessoa se considera para ordenar algo às minhas
professoras?”. Assim, não defendo minhas colegas de trabalho, exijo delas que
se coloquem no lugar de poder que a pedagogia tem, no lugar de transformação de
mundo que o conhecimento organizado, científico, cultural propicia ao indivíduo
que aprende, no local mágico de promover outro ser humano à posição de
conquista do arcabouço cultural e científico de todas as áreas do conhecimento
de forma autônoma sem perder seu potencial curioso, criativo e divertido. A
pessoa que propicia o alcance do entendimento dos códigos linguísticos e
matemáticos tem reservado para si o papel de transmutação definitiva de um ser
humano. Ela possibilita o domínio sobre muito do conhecimento guardado em
livros àquele indivíduo. Quão grandioso é este lugar e a pessoa que o ocupa!
Este é lugar é da pedagoga.
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