Já falei aqui sobre o
impacto de jogos eletrônicos sobre o desenvolvimento. Reitero minha opinião e
acrescento que atividades que restringem o movimento corporal ou que não o
promovem e estimulam, prejudicam o desenvolvimento psicomotor, o processamento
visual e o auditivo.
A psicomotricidade
relaciona-se aos sentidos cinestésico e vestibular. Sempre nos foi dito
vulgarmente que o homem tem cinco sentidos. Mas a ciência acrescenta-nos ainda
os dois acima indicados. O sentido cinestésico refere-se à percepção que temos
do nosso corpo em relação a si próprio. Mesmo sem utilizar a visão, é possível
saber onde estão braços e pernas, em que posição estão cada uma das mãos e pés.
Com o sentido vestibular nos referimos à capacidade de ter consciência do nosso
corpo em relação ao solo. Neste, utilizamos o labirinto cujo líquido sofre
influência da gravidade e receptores informam ao cérebro sua posição. Estes
dois sentidos trabalham juntos informando o sistema central de forma a podermos
nos movimentar ou permanecermos parados.
A coordenação de músculos
e informações é estabelecida e fortalecida com o uso. Nascemos com esta
capacidade, mas ela tem que ser desenvolvida. Um bebê apresenta movimentos
desordenados e cresce em direção ao autodomínio. A movimentação coerente,
ritmada, a boa mira, o alcance de objetos móveis são aquisições no escopo da
psicomotricidade. Pressionar, segurar um objeto e realizar movimentos determinados
com ele também são da ordem da psicomotricidade. São ações necessárias para a
escrita.
Aqui é possível perceber
com muita clareza que várias informações devem ser coordenadas, analisadas e,
posteriormente, utilizadas. Este raciocínio é fácil quando o foco é movimento,
mas talvez não seja tão claro para visão e audição. A organização dessas
informações é chamada de processamento. O uso deste termo talvez seja um
paralelo com teoria de computadores.
Assim, temos o
processamento visual e o auditivo. Estes dois não se relacionam à área médica
correspondente aos órgãos. Isto torna complicada a detecção de problemas, pois
a nossa sociedade é centrada em defeitos clínicos e não funcionais, como é o
caso do que tratamos aqui. Quando há problema, os pais levam os filhos aos
médicos que detectam malformações, deficiências, mas não encaminham os
pacientes para outros profissionais.
O processamento visual é a
junção das informações que vêm de cada olho. Se os olhos não focalizam a mesma
coisa, temos um problema no processamento da informação. Isto ocorre, de forma
simplificada, pela diferença de tônus muscular dos olhos. Sim, os olhos têm
músculos que os fazem mover-se em todas as direções e os impedem de girar para
trás. É fácil pensar que todos os movimentos que ocorrem ou podemos executar
são realizados por músculos, sejam lisos ou estriados. Que me corrijam os
especialistas no assunto. Temos três pares de músculos em cada olho e eles
estão sincronizados entre os dois olhos. A falta de tônus em um músculo de um
olho já faz com que seu movimento não seja completo, provocando a distorção na
junção das imagens.
Já o processamento
auditivo refere-se à decodificação dos estímulos elétricos traduzidos da
vibração causada pelo som a nível cerebral. De forma simples, a informação não
é compreendida quando há falha no processamento. Neste caso, temos uma surdez
funcional. Clinicamente, tem-se o aparelho auditivo perfeito. Suas funções e
estruturas estão preservadas, mas, por algum motivo, o cérebro não decodifica
suas informações.
Por que falo destes três
elementos se no início da postagem referí-me a jogos eletrônicos? Porque as
brincadeiras ao ar livre – subir em árvores, conhecer pássaros pelo canto e
localizá-los, brincar com formigas, pular corda, brincar de bola, jogar Pique-Pega,
jogar bola de gude ou biloca (se preferirem), ouvir histórias, brincar de
finca, bocha, fazer e soltar pipa, correr atrás de pipa voada, brincar de
elástico, pular Amarelinha, brincar de Esconde-Esconde, Cabra-Cega
–proporcionam o desenvolvimento do processamento auditivo, visual e da
psicomotricidade, necessários para uma vida saudável.
A busca de escolinhas de
esporte pelos pais modernos é bastante saudável, eu assim o considero.
Entretanto, os esportes direcionados e os jogos em X-box (bem melhores que os
sedentários videogames clássicos) não suprem em força, agilidade, diversão,
aprendizagem e prazer as brincadeiras "naturais". Basta pensar na
localização de um fruto maduro, a observação do caminho para chegar nele, a
subida na árvore (força, agilidade, raciocínio motor), o alcance da fruta, o
desfrute saboroso do objeto conquistado, a nutrição biológica, psicológica e
social resultante.
Parques, chácaras e
acampamentos podem propiciar este desenvolvimento caso as crianças sejam
estimuladas pelos pais. Digo isso porque não se deve esperar que uma criança
criada em apartamento suba numa árvore assim que a veja ou reconheça uma fruta
pelo pé. A insegurança das cidades faz com que a criação dos filhos se torne
uma tarefa muito mais complicada do que outrora foi.
Deixo como sugestão para
os pais que aproveitem esta indicação de atividade com os filhos para
desestressar de seus problemas cotidianos. Pensem que os aparelhos e a
indústria modernos já economizam muito do nosso tempo. Imagine quanto
tempo deve ser gasto para se plantar, colher, secar, torrar, moer, coar para
que finalmente se possa tomar um café. Este tempo economizado deve ser
investido em seres humanos mais saudáveis. Ofereça exemplos de saúde ao seu
filho.
E para você, psicóloga/o latente
ou profissional, oriente o seu cliente a abandonar atos autodestrutivos.
Estimule o convívio com a natureza indicando ações simples. Nossos corpos,
intelecto, crianças e futuro agradecerão.