sábado, 30 de janeiro de 2010

Projeto de Lei 3512 de 2008

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) de regulamentação da Psicopedagogia como profissão da Deputada Professora Raquel Teixeira. São oito artigos que indicam direitos dos profissionais que atuam em psicopedagogia e deveres também relacionados ao exercício da profissão. Falta os deveres da profissão, conforme apontou a relatora do PL na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, Deputada Gorete Pereira, em seu voto.

A justificativa para aprovação da lei versa sobre o fracasso escolar e seu magnitude apontada nas estatísticas da educação brasileira. O psicopedagogo é visto como o profissional que tem condições de resolver a situação. Como o PL é de legislatura anterior e foi resgatado pela referida deputada, ela menciona o primeiro autor, o então Deputado Barbosa Neto, e utiliza sua justificativa que aqui é apresentada em parte:

“A escola, que deveria ser local de promoção do desenvolvimento das potencialidades de todos os indivíduos, torna-se, para muitos, palco de fracassos ou de desenvolvimento insatisfatório e precário.

Esse quadro exige uma urgente revisão do projeto educacional brasileiro, de modo a melhorar a qualidade do que se ensina e de como se ensina; do que se aprende e de como se aprende. Essa situação só poderá ser enfrentada se o processo de aprendizagem for analisado sob uma perspectiva que considere não só o contexto social em que esta prática se dá, mas simultaneamente com a visão global da pessoa que aprende e de suas dificuldades nesse processo.

A resposta para tal desafio é a prática psicopedagógica. (sic) exercida por um profissional especializado, o Psicopedagogo, cuja atuação visa não apenas a sanar problemas de aprendizagem, considerando as características multidisciplinares da pessoa que aprende, buscando melhorar seu desempenho e aumentar suas potencialidades de aprendizagem.

Tendo adquirido conhecimentos multidisciplinares e manuseio de instrumentos psicopedagógicos específicos que lhes permitem uma atuação eficaz junto aos alunos, os Psicopedagogos são, hoje, os profissionais que apresentam as melhores condições de atuar na melhoria da forma de aprendizagem e na resolução dos problemas decorrentes desse processo.

Na relação com o aprendiz, o Psicopedagogo estabelece uma investigação cuidadosa, que permite levantar uma série de hipóteses indicadoras das estratégias capazes de criar a situação mais adequada para que a aprendizagem ocorra.”

Mesmo tendo estudado todo o PL para elaborar um parecer técnico a pedido do Conselho Regional de Psicologia da região 01, não identifiquei no documento as ações específicas deste profissional.

O campo de aprendizagem e seu estudo são objeto da psicologia. Não creio que haja discenso a respeito desta questão. Por que, então, ter lugar o chamado para outro profissional contribuir nela?

Analisando a justificativa de regulamentação temos a culpabilização do aluno por seu fracasso escolar, idéia já tão discutida e combatida pela psicologia escolar. É a criança que está no centro da problemática, aparentemente como vítima.

A expressão “exige uma urgente revisão do projeto educacional brasileiro” tem como resposta a criação de mais uma profissão. Um profissional vai resolver o problema que professores, pedagogo, gestores, pais, psicólogos, orientadores educacionais não conseguem resolver na escola e que especialistas sociólogos, antropólogos, pedagogos, psicólogos, filósofos, pesquisadores da educação não conseguem resolver nas secretarias municipais e estaduais de educação e ministério?

Este profissional é chamado a sanar os problemas de aprendizagem e melhorar o desenvolvimento e aumentar o potencial dos indivíduos na escola.

Este é o ponto que gostaria de chamar atenção.

É óbvio, para quem é realmente educador, que não é a entrada em cena de um novo ator, que mudará o roteiro da peça. Não acredito que um psicopedagogo na minha escola alterará a “produção” do fracasso escolar. Tenho trabalhado com pedagogas especialistas em psicopedagogia que, apesar de sua competência profissional, não sabem o que fazer em determinadas situações e, principalmente, não sabem lidar com o principal ator do processo ensino-aprendizagem, a saber o professor. Não conseguem expor inteligivelmente ao professor as questões que viram na relação do aluno com o objeto de saber. Os psicopedagogos já estão atuando e seu surgimento – na década de 90 – não provocou impacto algum nos índices de fracasso escolar.

O que mais me aflige é que problema de aprendizagem é assunto da Psicologia. Será que nós, psicólogos, temos alguma dúvida quanto a isto? Assim, questiono nossa atuação nas escolas e nas clínicas. O que estamos fazendo, ou deixando de fazer, que permite que um grupo (grande) de pessoas resolva fazer o nosso trabalho?

É justamente por ver tantos profissionais achando que podem fazer o nosso trabalho nas escolas que proporcionou a criação deste blog.

Nosso trabalho é muito importante, necessário e sério. Assim deve ser encarado e realizado junto aos demais profissionais da educação para que estes percebam nosso espaço e respeitem-nos. E o respeito refere-se a não tentar fazer o que é nosso e esperar nossa atuação correta. Não há como provocar isso apenas com palavras e textos escritos. Devemos atuar com a responsabilidade da estabilização da Psicologia Escolar enquanto profissão.

Nas escolas em que atuei, os demais educadores não sabem o que um psicólogo escolar faz. Esperam que façamos clínica dentro da escola. Quando digo que tal ação é vetado legalmente, eles caem em um vazio, não sabem quem devem encaminhar para mim e se assustam quando peço para entrar em suas classes.

Vejo que há espaço a ser ocupado e não estamos competentes o bastante para fazê-lo. Outros grupos também vêem o espaço e querem ocupá-lo.

Há também a questão de que as escolas, públicas e particulares, estão fechadas para nós. Com a desculpa de parcos recursos, não somos contratados. Creio que esta profissão não está estabelecida plenamente a ponto dos gestores não perceberem nossa importância. Nossa atuação profissional responsável, focada na construção desta área, embasada teoricamente, juntamente com o apoio do Conselho Federal de Psicologia e dos Conselhos Regionais poderão responder a comunidade educacional qual é o nosso papel nas escolas e na educação não sendo necessário mais ninguém para resolver os problemas de aprendizagem que têm solução nas escolas.

Reformas educacionais são necessárias sim, não com “novos” profissionais, mas com ações reais, fortes e impactantes desde o nível ministerial até as secretarias municipais e boas gestões administrativas escolares. Educação não é brincadeira.

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