segunda-feira, 20 de julho de 2009

O que espera a escola

A expectativa de trabalho por parte das escolas em relação ao psicólogo escolar é clínico. Alunos que demonstrem comportamento diferenciado dos demais em movimentação, comunicação, agressividade são os principais encaminhados para nós. Podemos fazer muitíssimo mais do que esperam que façamos. Isso é uma vantagem e uma desvantagem a um só tempo.

A desvantagem se faz quando o profissional não dimensiona seu real potencial e ajusta-se a demanda apresentada. Mantém-se no atendimento clínico e aguarda que o chamem ou encaminhem os alunos para si. Esta restrição de ação é altamente criticada pelas colegas acadêmicas que têm escrito sobre a nossa área. Elas têm toda razão. E eu só poderia concordar com elas, pois que me formaram e continuam formando, são elas que escrevem o que leio para me orientar sobre o meu trabalho. Sim, elas têm razão, mas nem desconfiam como é mais seguro permanecer em nosso escritório dentro da escola. É melhor até do que clinicar independente porque não há preocupação com a “conquista” de clientes.

A principal desvantagem é para a classe de profissionais psicólogos porque a sociedade não conhece as ações de um psicólogo escolar e sem que lhe seja apresentada, não saberá. Sem saber, não usa, não valoriza, não emprega. E a área cresce lentamente, vagarosamente, tendo cada psicólogo individualmente que provar que seu trabalho é necessário e importante para o melhor desenvolvimento dos alunos.

A vantagem é que quando mostramos do que nossa ciência nos capacita somos chamados a participar em muitos eventos da vida escolar. Apesar de não sermos vanguarda na psicologia, o somos na escola, que espera muito do psicólogo escolar, mas nem imagina o que pode esperar.

A grande ansiedade da escola é por resultados rápidos. Ela quer que consertemos os alunos. Essa expressão é minha, pessoal. Mas não pensem que querem se livrar das crianças ou do problema em si (consertei, taí o anjinho!). Elas se preocupam e querem que o aluno se desenvolva da melhor maneira possível. O tempo delas é diferente do nosso. Nós aprendemos a trabalhar em pro-ces-so. Leva t-e-m-p-o. Às vezes, nossas soluções demoram muito para elas e são bem ligeiras para nós.

Contarei um caso para mostrar a questão do tempo:
Uma professora, muito preocupada com o bem-estar de seus alunos, solicitou-me atendimento para uma aluna adolescente ao final de uma reunião de rotina. Relatou os comportamentos preocupantes e eu anotei o nome da aluna, série e turma. Como as nossas reuniões ocorriam às quartas-feiras e quinta e sexta era folga das professoras, somente na semana seguinte tive contato com a professora novamente para me assegurar do caso. A aluna demonstrava comportamento completamente diverso do esperado para ambiente de aula, permitia que os colegas tocassem seu corpo e aproximava-se deles provocativamente, dirigia-se a eles de forma inadequada dentro e fora da classe e não demonstrava qualquer motivação pelas aulas. A professora em questão era das poucas unanimidades inteligentes do planeta: todos a adoravam, admiravam e respeitavam. Então a informação final foi bastante surpreendente. Busquei informações com outras professoras que confirmaram. Na terça-feira, fui ver a aluna em sala de aula e ela não estava. No dia seguinte, ausente. Liguei para os pais. O padrasto me informou que a família precisava de auxílio, pois não sabia o que fazer com a garota. Ela estava saindo e chegando embriagada em casa. A mãe decidira mandá-la para a casa do pai. Fiquei assombrada pela situação e pela percepção da professora. Marcamos reunião com a mãe para o dia seguinte. Bastante angustiada, a mãe demonstrou sua emoção rapidamente. Contou suas dificuldades para criar os filhos e que estratégias havia usado para resgatar sua filha. Alguns percalços já aconteceram e as soluções que proporíamos já haviam sido aplicadas sem sucesso. A mãe, então, como última idéia, mandou a filha para a casa do pai para que essa percebesse a diferença de tratamento e conforto entre as casas e pessoas, a partir daí valorizasse a mãe e se enquadrasse nas regras da casa materna. Bem pensado, se não fosse o risco aumentado na casa paterna: vizinhança altamente violenta, tráfico de drogas e, pior, possibilidade de sedução do próprio pai. Alertada para os riscos, a mãe se mostrava sem saída. E eu... que situação! Informei à mãe que a aluna deveria comparecer às aulas pois estavam em período de provas e as crianças devem freqüentar escola por força legal. No dia seguinte, a aluna se fez presente na sala de aula e também na minha sala. Minha surpresa foi imediata, pois quando comecei a estabelecer o rapport, a aluna emocionou-se igualmente à sua mãe. Seu discurso apontava para a barreira de comunicação familiar. Eu então compreendi o que faltava: afeto, atenção, carinho físico e emocional, reconhecimento, partilha. Percebi a grande amizade que havia entre mãe e filha e como elas sentiam falta uma da outra, devido a uma suspensão dos laços de amizade. Mas já era sexta-feira! Liguei para a mãe e ela não atendeu. Liguei de novo mais tarde, eu estava com pressa e a memória, sobrecarregada, a escola era grande. Consegui marcar uma conversa tripla para segunda-feira. A mãe foi pontual e eu busquei a aluna na sala. Ordenei que se cumprimentassem como se eu fosse um general. Deveria ter cronometrado. Também precisamos de muitos lenços de papel. Esclareci qual era o problema entre as duas e dei-lhes oportunidade de falar de modo que pudessem se ver e repetir aquele momento em casa sempre. Também “ordenei” que se cumprimentassem sempre que se vissem – boa técnica para trocas físicas necessárias na adolescência quando se perde o colo infantil. Quando a aluna saiu, questionei sobre o casamento e mostrei erros comuns que destroem relações muito saudáveis. A mãe foi embora bastante aliviada, tendo afirmado que a filha já havia mudado em casa, para minha sincera surpresa. Após cada contato com mãe ou filha, eu informava à professora. Na quinta-feira, a referida profissional me procurou. A aluna era outra: atenta, disposta, respeitosa. Para minha sincera surpresa: nunca havia tido um resultado tão rápido. Duas semanas!

Foi um tempo adequado para a escola.

2 comentários:

  1. Êxito conseguido através de sua sensibilidade,paciência, seu olhar. Obrigada por estar sempre por perto. NECESSÁRIA!! (O psicólogo cuida da gente, e quem cuida dele ??)
    Eu cuido! Precisando de mim, também estou aqui.
    beijooooooo - Lana

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  2. Esta é a minha querida amiga/colega orientadora educacional.
    É verdade, ela cuida de mim!
    Sou-lhe muito grata.
    Agradeço às minhas caras orientadoras educacionais, que além de me educarem, compartilham sua sabedoria comigo e me ensinam a trabalhar em conjunto.
    Beijos enormes, meninas!

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