quarta-feira, 29 de abril de 2009

Excesso de exigência parental

Uma amiga escreveu-me a seguinte história e solicitou que desse meu parecer profissional. Obrigada pela pergunta.

Teve um dia que a minha turma fez a prova trimestral.
Depois da prova, o professor ficou corrigindo e ele conseguiu terminar de corrigir duas provas.
Ele chamou uma amiga minha para ver a nota que ela tirou na prova.
Ela olhou e depois foi se sentar na carteira.
Ela é uma das mais nerds da turma, então todo mundo pergunta quanto ela tirou em cada prova.
As pessoas perguntavam e a minha amiga se recusava a responder, e ainda por cima começou a chorar.
Finalmente ela falou a nota dela para as amigas mais chegadas (não que fosse garantir alguma coisa, esse povo é muito fofoqueiro e era uma questão de segundos de que a nota dela fosse se espalhar para a turma), que foi 31, 5. De 40.
Outra amiga minha, que tira notas meio ruinzinhas falou que se ela tirasse essa nota ela ia ficar gritando de alegria, pois a nota estava muito boa.
A garota que estava chorando falou que sabia que a nota estava boa, mas que a mãe dela ia tirar tudo dela, ia botar ela de castigo, tirar a televisão, a internet...
Porque a mãe dela exigia que ela tirasse acima de 90.
A grande maioria dos pais exige muito dos filhos, então eu gostaria de saber por que os pais fazem isso com os filhos, o que isso pode provocar na saúde mental e emocional da criança, e quando essa pressão passa dos limites.

Esta criança terá em sua personalidade forte impacto advindo dessa forma de lidar com suas produções. Os analistas de bolsa de valores são nossos exemplos de profissionais altamente estressados. Eles realizam grandes ganhos quando jovens e se aposentam logo. Porém, os estragos para sua saúde são permanentes. Penso eu que parte de sua fortuna é gasta com reparos e recuperação de bem-estar. A forma com que esses trabalhadores lidam com metas é a mesma da criança descrita. A meta é o limite máximo e não há desculpas admissíveis para não alcançá-lo.
Quando detectamos uma questão como esta na escola, convocamos os pais e alertamos para os riscos que se corre com tanta pressão. Essa criança crescerá sem segurança, pois crê que apenas tendo alto desempenho obterá ganhos, que na infância é, sobretudo, o amor parental. Desenvolverá auto-crítica exacerbada e sua satisfação com o que realiza terá seu potencial bastante reduzido. Provavelmente se tornará perfeccionista e a face patológica desta característica é a neurose obsessiva. Essa última se expressa de várias formas e a que temos mais notícia é a denominada “mania de limpeza”. Os workahoolics também são exemplo.
A alta exigência dos pais pela produção dos filhos passa a ser exagerada quando as crianças deixam de fazer coisas prazerosas para atender tal demanda. Deixam de brincar do que gostam para atender as atividades que os mais velhos impõem ou quando demonstram fragilidade emocional e física, chegando a apresentar doenças.
Para controlar o excesso na imposição de metas por parte dos pais, a ação é bastante dura. Expomos os prováveis efeitos para os pais. Geralmente, os impactos já podem ser observados quando detectamos o problema. Assim, apontamos aos pais as características de personalidade do filho influenciadas por esta ação. Elas são facilmente perceptíveis através de observação do aluno, entrevista com ele e com os pais.
Como no exemplo oferecido, a reação emocional da criança frente à nota “ruim” é desproporcional e despropositada para padrões normais de educação. Tanto que assustou nossa amiga. Sua reação já nos mostra o quanto a necessidade de agradar os pais é importante para esta criança e como ela se esforça para atingir suas metas máximas independentemente dos próprios limites emocionais, intelectuais ou físicos.
Pais como estes têm por objetivo o melhor preparo do filho perante a vida, o mercado de trabalho. Nada há de errado neste ponto, porém a importância que empregam ao resultado é exagerada e isso prejudica a livre expressão do filho, esmagando-o. Há crianças que conseguem negociar seus resultados com os pais e lidam bem com tal pressão. Crianças mais frágeis, como a do exemplo, podem ter aspectos da personalidade pouco desenvolvidos devido ao excesso de exigência em campos eleitos pelos pais. Pode ocorrer até a falta de estimulação em uma área na qual o indivíduo se destacaria. Devido ao problema aqui analisado, a outra área fica negligenciada e, não se desenvolvendo, pode impedir a realização da pessoa completa.